Gripe aviária em vacas leiteiras detecta mutações que aumentam sua virulência
Em março de 2024, um surto de gripe aviária foi registrado pela primeira vez em vacas leiteiras nos Estados Unidos. Isso foi sem precedentes, já que o vírus H5N1 havia afetado apenas aves e alguns mamíferos. Desde então, o vírus se espalhou rapidamente: até setembro de 2025, 1.080 casos foram relatados em bovinos em 18 estados, de acordo com dados do Departamento de Agricultura dos EUA.
A cepa identificada pertence ao clado 2.3.4.4b do vírus H5N1, um vírus altamente patogênico que também é responsável por infecções em aves e outros mamíferos. Além disso, 70 casos foram confirmados em humanos, principalmente trabalhadores de fazendas leiteiras; um deles morreu em decorrência da infecção.
Mutações que explicam maior virulência
Um estudo recente publicado na Science Advances analisou as características específicas do patógeno detectado nos Estados Unidos e mostrou que ele difere do vírus H5N1 que circula na Europa e na Ásia. Segundo os pesquisadores, duas mutações genéticas específicas explicam sua maior adaptabilidade e virulência.
Trabalhos em modelos animais revelaram que alterações nos genes PB2-478I e NP-450N aumentam a capacidade de replicação viral. Isso permite que o vírus se espalhe mais rapidamente dentro do organismo infectado. Quando os cientistas eliminaram essas mutações em laboratório, os animais pararam de desenvolver infecções sistêmicas, confirmando seu papel na patogenicidade.
A equipe, liderada por Young-Il Kim, do Centro de Estudos de Vírus Emergentes da Coreia do Sul, também confirmou que as amostras mutadas podem se replicar em células humanas e glândulas mamárias bovinas. Essa descoberta reforça as preocupações sobre a adaptação do vírus a novas espécies.
Reações científicas e medidas de vigilância
"O estudo fornece evidências cruciais sobre os determinantes genéticos associados à virulência do subtipo H5N1 da gripe aviária em vacas leiteiras. É prioritário fortalecer a vigilância epidemiológica e a pesquisa sobre mecanismos de adaptação", explicou o virologista Aitor Nogales, do Centro de Pesquisa em Saúde Animal da Espanha.
A Sociedade Espanhola de Medicina de Emergência também alertou em setembro sobre a necessidade de preparação. Enfatizou que, embora as cepas que circulam na Europa e nos Estados Unidos não sejam idênticas, o aumento de surtos de gripe aviária altamente patogênica é um fenômeno global.
Implicações para a saúde pública
A disseminação da gripe aviária em vacas leiteiras levanta questões sobre o impacto na saúde pública e na segurança alimentar. Embora os casos humanos tenham sido isolados e associados ao contato direto, a possibilidade de novas adaptações do vírus exige medidas de controle rigorosas.
A experiência serve como um lembrete da importância da biossegurança em fazendas leiteiras e sistemas de produção intensiva. Para os trabalhadores, isso significa protocolos mais rigorosos, desde roupas de proteção até exames de saúde frequentes. Em nível internacional, o episódio reforça a necessidade de cooperação científica para monitorar possíveis mudanças no vírus e antecipar riscos de transmissão.
O monitoramento dessa cepa em bovinos estabelece um precedente único. Até agora, o H5N1 afetava principalmente aves, mas sua detecção em bovinos confirma que sua capacidade de adaptação é maior do que o esperado.
Com mais de mil casos relatados e mutações associadas a maior virulência, a comunidade científica insiste na importância de manter a vigilância e aprofundar as pesquisas para evitar cenários mais complexos.
A disseminação da gripe aviária em vacas leiteiras exige o fortalecimento da cooperação internacional em vigilância epidemiológica. A Organização Mundial da Saúde Animal já instou os países produtores a compartilharem dados mais rapidamente, visto que o vírus não reconhece fronteiras. Para a América Latina, onde a produção leiteira é fundamental, esse precedente nos Estados Unidos é interpretado como um alerta precoce para evitar riscos futuros.